irreparable dream
Sonhos de papel. @divineintention




posted : quarta-feira, 16 de março de 2011
title : Amarga


O sol escaldante penetrava na testa alva da menina, o suor lhe escorria o rosto, respingando trabalho. Sua respiração demasiadamente acelerada condenava seu esforço, antes mesmo de raiar o dia Mariazinha realizava seus afazeres no canavial. Estrela lhe observava atentamente, respondendo os comandos de sua dona pequenina, comandos estes indicados por sons e gestos estranhos.

- O que será que tem no céu, Estrela? – Sussurrou pesadamente, temendo que Seu Antônio a escutasse.

A cadela fez um som gutural com seu latido fraco, parecendo entender alguma coisa. Mariazinha ria da própria desgraça, naquela seca endiabrada, sem fim. Estava ela faminta, seu estômago roncara alto diversas vezes.

O pai deu-lhe um safanão fraco no braço, assustando-a enquanto falava rapidamente:
- Ande logo, menina. Vamos pra casa.

Depois de uma longa caminhada arrastando seus cambitos de perna pelo chão erodido, chegaram. Sinhá Maria esperava na janela da cozinha.

- Lava as mãos e senta, Mariazinha. – Disse Sinhá Maria, depois de recolher o facão do marido carrancudo.

Estrela acompanhou a menina e sentou-se logo ao lado da mesa, aguardando umas migalhas. Acreditava Mariazinha, que os pais eram tão brutos pelas dificuldades de ter uma filha mulher no sertão nordestino. Mas não se ocupava com tantos questionamentos, sonhava com uma vida melhor, se é que ela tinha uma vida para começo de conversa.

A chuva era outro fascínio da menina, algo tão produtivo vindo do céu, tão grande e tão cheio de coisas novas, diferente de sua vida monótona.

Em um dia qualquer enquanto observava aquele céu sem estrelas e a paisagem castigada pela seca, com sua companheira Estrela no colo, perguntava-se como esse mundo imenso era tão cruel. Devia ser por causa do tamanho.

- Trate de deitar, Mariazinha! Amanhã antes do sol nascer temos que trabalhar, inferno! – Seu Antonio berrou do quintal. Era só isso que ele falava. Trabalho.

A menina se levantou um pouco debilitada dos pulmões, sentia o ar faltar-lhe. Estrela latia sem cessar chamando a atenção de Sinhá Maria, que sacudiu Mariazinha tentando ajudá-la.

- Vai dormir antes que teu pai berre outra vez, minha estrela.

Em um segundo a menina acreditara na bondade da mãe, mas eram todos iguais. Todos presos naquela vida amargurada e difícil, esperando por chuvas que nunca viriam.

Deitou-se na cama de madeira desconfortável, Estrela pulou e acomodou-se ao seu lado. Ainda tossia, debilitada. Como há de faltar ar desse jeito? O céu não era tão cheio de ar?

Estrela observou a dona pequena, como sempre fazia. Mariazinha fechou os olhos lentamente, concentrando-se num sonho bom, era a única coisa que podia ter.

O sol era seu inimigo. A lua era mais bonita, trazia uma paz que não existia, e as estrelas... Sempre tão alegres. O céu definitivamente não deveria ser seco. Ou deveria?

Ela iria descobrir, ouvindo o som da chuva lá fora... Espere, chuva? Deveria mesmo estar sonhando. Imaginou o único sorriso que sua mãe lhe dera na vida, quando ela batizou Estrela. Era esse o nome de Mariazinha para sua mãe... Uma estrela.

Em seu leito de morte pôde imaginar os gritos de agonia da mãe, enquanto pegava alegremente as mãos do céu, deixando de viver nesse inferno.

Ela não estava mais sonhando, finalmente teve o descanso eterno.

Jazia ali: A glória da chuva e a perda de uma estrela.


Nota da autora: Essa foi uma narração inspirada na obra "Vidas Secas" de Graciliano Ramos, à pedidos da minha querida professora de redação. Ela ainda não corrigiu, então não a pequem por meus erros.
Espero que gostem,
Manuela.

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